segunda-feira, 19 de abril de 2010

ENTREVISTA BOA...P'RA CACHORRO - DOCA RAMOS MELLO





Ele foi visto pela última vez arrastando Karadekatraia atrás de sua coleira. Como foi fotografado e engalanou o cenário da mulher comum com afinidades populares, está sendo entrevistado agora pela repórter constrangedora, Jadilúcia Flores, aquela que dá voz aos que nunca a têm na mídia nacional.

Com vocês, o Cachorro da madame.



Jadilúcia Flores: O que você tem a dizer a seus pares, digo, a seus semelhantes, sobre esse passeio dado ao lado de Karadekatraia, enquanto ela fazia caminhada?



Cachorro: Au...?



JF: O mundo canino deseja saber quais as suas impressões sobre a caminhada com A Coroa...



Cachorro: Fui contratado para fazer o papel de pet, animal de estimação, me deram até uma alcunha falsa, meu nome é outro, mas prefiro o anonimato, por favor. Quero deixar claro que nem sabia de quem se tratava, só me inteirei na hora do marketing. Contudo, tenho a impressão de que me saí bem, você não acha? Fiz uma pose bem relaxada, eu creio que passei a ideia de que ela é como todo mortal brasileiro que tem um cachorro e estava ali passeando com ele, de agasalho, parecendo gente como você, por exemplo. Ficou bom, não foi? Se bem que aquele bonezinho...



JF: Se era um papel, acho que sim, você foi bem. Quer dizer que foi pago para ser fotografado?



Cachorro: Au, au, olha aqui minha querida, não posso dar detalhes dos acertos, você sabe, isso só com meu assessor de imprensa, por sinal o mesmo do Rodrigo Santoro, ou com a agência, pois caninamente estou proibido por contrato de falar sobre o assunto e dar entrevistas, só estou fazendo isso porque você é uma moça legal no exercício da sua profissão, eu respeito muito o trabalho alheio, sei o que é isso, também sou um trabalhador.



JF: Ah, então você tem assessor de imprensa e agente...



Cachorro: Claro. E aceitei esse contrato porque exigia pouco, uma caminhada de mentirinha, e pagava bem, apesar da companhia, que reconheci assim que ela me segurou a coleira, ô mulher desajeitada... Au, desculpe a indiscrição, mas vi também que quase ninguém vai muito com a cara daquela senhora, percebi isso rapidinho, quando o fotógrafo contratado para nos ‘flagrar’ na caminhada fez aquele gesto de quem está com o saco cheio e ainda virou os olhos, dizendo baixinho ‘só me faltava essa boneca terrorista de ventríloquo’, entende?



JF: Quer dizer que um fotógrafo foi contratado para fazer de conta que encontrou a Karadekatraia na caminhada com o cão fiel...



Cachorro: Eu pareci fiel? Que bom! Estou cursando o Célia Helena e cada vez mais me convenço de que em breve a Globo vai me chamar para uma ponta na novela das sete. Eu vou ficar muito mais bonito que a macaca que fez o Chico, afinal tenho mais porte e já sou uma celebridade, quase um BBB – aquilo foi um reality político -, preciso aproveitar este momento. Acaso me viu no jornal? Notou minha nobreza canina? Eu a mantive, apesar das circunstâncias adversas, sou o melhor amigo do homem, sabe como é... Mesmo ali, sustentei meu papel, au, que cruz, a mulher não tem sensibilidade nenhuma, você viu a lambança que ela fez em Minas? Só podia ter levado a invertida que os mineiros deram nela, imagine, falar em Dilmasia, quá, quá, só se for DilmAzia, au!



JF: Há outras aparições suas programadas na agenda da candidata?



Cachorro: Espero que não, porque ela tem pé duro, pisa como se usasse coturnos, parece um tanque de guerra, não está habituada a andar a pé, não tem leveza nem molejo e não obedece aos comandos, é muito tosca. Já fiz o sacrifício, está de bom tamanho, chega, Dilmesqueça, au!



JF: Vai trabalhar durante a campanha?



Cachorro: O espírito da Lassie me livre! Imagine o sofrimento de aturar V. Exa. Metalurgíssima com sua fala de caverna sem fundo e os dentões da Karadekatraia, ah, não, eu não mereço! Piedade, Senhor!



JF: Mas, se ela for eleita você pode ser elevado à categoria de primeiro cachorro, que tal?



Cachorro: Auuuu, Dilmalandra, nem morto, Rim-tim-tim me defenda!



JF: Olhe que deve ser um vidão...



Cachorro: É, vai ver você pensa que, cachorro sendo, dou-me o desfrute de ser comprado com um Bolsa-Ração ou Bolsa-Osso, mas comigo o buraco é mais em cima, só fiz um frila, como vocês jornalistas dizem, cumpri meu contrato, e torno a frisar que não sabia com quem ia contracenar, escreva isso aí. Não me tire pelos ignorantes que assolam este país.



JF: Como assim ? O que você está querendo dizer?



Cachorro: Não estou querendo dizer, estou dizendo que vocês, humanos brasileiros ignorantes e acomodados, estão vendendo suas almas ao Diabo Ordinário que, mais dia, menos dia, vai cercar vocês todos dentro de um inferno que ele e a turma dele estão montando p’ra vocês. É por isso que lhes dão tudo o que lhes dão, de pouquinho em pouquinho, a conta-gotas, para viciá-los, castrá-los. Estão é cevando vocês, bando de trouxas, enquanto preparam o controle das comunicações, do conteúdo dos currículos escolares, das universidades particulares... Comigo não, sou cachorro, não sou burro.



JF: Mas...



Cachorro: Mas o quê? Você vai dizer que isso não é com você e blá, blá, blá. Assim, acha que está a salvo, a culpa não é sua. Porém, a maioria esmagadora está aí, abanando o rabo, como diz minha espécie, por uns caraminguás, e achando é bom! Pois se vocês não fizerem alguma coisa, o tsunami vai chegar, e quando ele chegar, vai engolir você também e aí, babau Brasil.

DOCA publicou esta crônica em : http://www.papolivre.com.br





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