O Prêmio Klunge
aprofunda o fosso que separa um estadista de um sucessor
rancoroso
MAURO
PEREIRA
Ao receber do Congresso
norte-americano o prêmio Klunge, versão alternativa do Nobel sueco, em
reconhecimento à inquestionável obra intelectual e ao notável desempenho como
chefe do Governo brasileiro, Fernando Henrique Cardoso não só esparge um pouco
de luz sobre a embolorada intelectualidade do País do Carnaval como também
desagrava a Presidência da República, instituição tão vilipendiada nos últimos
nove anos.
Hoje, todos os
brasileiros desprovidos de rancores rendem homenagens ao risonho octogenário que
mudou a história política e social do Brasil pós-ditadura. A lamentar, apenas a
pouca disposição da imprensa para compreender a importância do evento. As
publicações que noticiaram o acontecimento não foram além de textos
comprometidos pelo espaço acanhado e pelo laconismo. Todos se abstiveram de
contar aos leitores o que levou os julgadores a considerar FHC o maior pensador
da América Latina, e a premiá-lo com a soma de 1 milhão de
dólares.
Democrata autêntico,
avesso à retórica vazia e oportunista, Fernando Henrique retirou o Brasil da
categoria de república terceiromundista para colocá-lo no patamar reservado às
grandes nações. Sábio, ensinou que é possível fortalecer a sociedade sem
fragilizar o estado. Hábil, restituiu aos cidadãos o poder de definir os rumos
do país.
O sucesso irrefutável de
sua administração transformadora fez com que aflorassem sentimentos pouco
nobres, como o ciúme e a inveja.
Incentivados pela
omissão dos companheiros de partido do ex-presidente, adversários políticos
afundados em rancores e na miséria ética colocaram em prática uma sórdida
campanha cujo único propósito era a desconstrução impiedosa do grande legado
administrativo, político e moral deixado pelo governante
formidável.
Abandonado por
correligionários pusilânimes e injustiçado por grande parte da imprensa, o maior
presidente de nossa história travou praticamente sozinho a luta desigual em
defesa das grandes conquistas de seu governo. Liderados por Lula, seus algozes
tentaram consumar outro linchamento moral com uma violência jamais vista.
Bilhões de reais foram torrados na tentativa de apagar da memória política
nacional o líder que venceu a hiperinflação que vitimava sobretudo os mais
pobres, estabeleceu os fundamentos do equilíbrio macroeconômico ─ preservados
até hoje por seus detratores, ressalte-se ─, consolidou a democracia e fixou as
diretrizes de programas sociais que, expropriados cinicamente pelo PT,
desembocaram no Bolsa Família.
FHC saiu mais
fortalecido da ofensiva permanentemente alimentada pelo ódio inexplicável do seu
sucessor. Aos 80 anos, sereno e extraordinariamente lúcido, a vítima dos ataques
virulentos coleciona demonstrações de admiração e respeito oferecidas por
brasileiros decentes, pelas plateias das conferências que tem feito no exterior
por leitores das obras que se espalham pelas bibliotecas das universidades de
dezenas de países.
A conquista do Prêmio
Klunge aprofunda o formidável fosso que separa Fernando Henrique Cardoso e Luiz
Inácio Lula da Silva. O confronto das inumeráveis diferenças atesta que FHC, sem
nunca ter reivindicado tal status, é o estadista que Lula imagina ser, porém
jamais será. O prêmio concedido pela Biblioteca do Congresso norte-americano não
deve ser visto como mais um exemplo de que “a justiça tarda mas não
falha”.
No caso de FHC, um dos
intelectuais mais reverenciados do século XX, a justiça jamais tardou, tampouco
falhou. Seus inimigos é que se divorciaram
dela.