terça-feira, 20 de agosto de 2013

QUESTÃO GASTRONÔMICA - DOCA RAMOS MELLO


                                                           Questão Gastronômica

 

                                                                                                       Doca Ramos Mello

                                                                                                    ddramosmello@uol.com.br

 

 

            Ainda existe muita gente que não valoriza nossos políticos, mas isso se deve a uma premissa indecente, segundo a qual eles todos não prestam. Mentira! É claro que muitos não valem um tostão de titica de galinha, mas há outros tantos tão valorosos que me custa fazer uma lista. Mesmo assim, acho que vale a pena citar um caso recente que envolveu os irmãos Gomes e um deputado nordestino, cujo nome não guardei comigo, provavelmente porque eu também faço parte da gentinha que gosta de achincalhar esses abnegados... Em compensação, retive na memória sua silhueta e suas palavras, ambas capazes de extrapolar os limites da minha tela de TV.

            Eu estava ligada nas notícias. E as notícias são sempre muito nojentas, é roubo, é corrupção, é quadrilha, é o Lewandowski com a maior cara de sapo a receber a Ordem do Rio Branco por serviços prestados ao governo... Aliás, se não fosse por ter trabalhado “para o governo”, para o povo é que não teria movido uma palha, ô qual.

            Bom, lá estou eu, diante do noticiário. Nisso, aparece uma reportagem sobre o irmão de Ciro Gomes, o Cid, governador do Ceará. O Ciro Gomes, todo mundo sabe, se notabilizou por ter a boca grande e o apetite político maior, mas cravou seu estilo homem distinto quando um jornalista lhe fez uma instigante pergunta: “Qual será o papel da sua mulher, a atriz Patrícia Pilar, se o senhor for eleito presidente da República?”, questionou o rapaz. “O papel dela é dormir comigo”, atacou o elegante cavalheiro, que adora dizer-se nascido em minha Pindamonhangaba. Papa fina, o sujeito. O que ele não sabe é que filho de gato que nasce no forno não é biscoito.

            Voltemos a Cid. Para ilustrar, fazendo jus à noblesse do mano, ele também foi cortês com jornalistas, quando ficou descoberto que levara a mãe, Dona Maria, à custa do erário, para passear em Nova York. Questionado, foi direto ao ponto: “Minha mãe tem mais de 80 anos”... Ué, a minha, também! Acima de 80 anos a pessoa ganha passagens do governo para o exterior? Vejam vocês, eu nem sabia disso, que coisa, o  Brasil é uma surpresa...

            Cid, de novo. Colocaram no noticiário a contratação, pelo governo dele, de um bufê chiquérrimo, caríssimo, para atender aos eventos do executivo. E como jornalista é um bicho desgraçado de enxerido e  ruim, exibiram na tela da TV o cardápio contratado. Incluía lagosta, escargot ao creme, caviar e o cacete a quatro, luxo puro. Havia itens lá que, aposto, 70% da população brasileira não conhecem, mas a do nordeste então, nem se fala. O povo de lá, arre égua, conhece mesmo é a seca que nunca acaba, o Sarney que também não finda, a caatinga, a fome, a falta de recursos, a extrema pobreza... Eu me detive no escargot porque fiquei pensando se existe cultura do bicho lá onde os Gomes vivem, pois do contrário será preciso buscá-los fora do Estado, do país até, um trabalhão. Bom, mas dinheiro tem para importar a encomenda, não há com que esquentar a cabeça, a França está cheia desses bichinhos, mandar buscar lá é bico, né Cid?

            Aí, teve jornalista metendo a lenha no bufê, no Cid, no cardápio, ô gente!

            Todavia, um deputado nordestino gordíssimo, desses cuja pança e bochechas extravasam os limites da telinha, apareceu para defender Cid Gomes – o nordestino é, antes de tudo, solidário, amigo, parceiro. E o cidadão engatilhou uma defesa impressionante, insuflando as faces coradas e movendo o bigodinho com sofreguidão, arremessando seu nordestês entremeado de perdigotos, furioso. Argumentou severamente ele, à guisa de esclarecer a malta de ignorantes da qual, sou forçada a reconhecer, fazia parte até que tal deputado me abrisse os olhos ignorantes. É longa a noite dos que desconhecem as verdades da vida, por isso toda lanterna é bem-vinda.

            “O governador não pode receber visitas ilustres, estrangeiros, e oferecer a eles buchada de bode, bolo de rolo e paçoca”. Falou e disse, o deputado gordo. Que categoria! Ninguém ainda havia pensado nisso, o cidadão quando viaja quer receber tratamento VIP do tipo que tem em casa, está certíssimo. Ele quer comer aquilo que está habituado a ver em sua mesa lá nas terras dele, não viria aqui para apreciar mingau de fubá, carne seca e farofa, barreado ou vatapá, ora me creia vamos deixar de burrices. Todo mundo sabe que por aí afora é assim, a Camarada Rousseff, por exemplo, quando vai a Londres, já manda logo avisar a rainha para que a coroa trate de ordenar uma feijoada, arroz de carreteiro, pão de queijo, mugunzá, suco de graviola e outros itens brasileiros, é assim que funciona. O problema é que nós ainda somos meio atrasados nessas questões gastronômicas, a gente não entende as mumunhas da mesa estrangeira e, de repente, comete a indelicadeza de, na Bahia, oferecer bobó de camarão aos visitantes, Jesus, Maria, José!

            Eu ainda volto a ver o brilhante deputado por aí e conto o nome dele para vocês poderem reverenciar-lhe o aparte defensivo. Em compensação, Cid Gomes vocês não hão de esquecer, ele e Ciro são os dois filhos de Dona Maria, a viajada. Penso em sugerir a Ziraldo que escreva uma história em quadrinhos intitulada “Os irmãozinhos maluquinhos”, que tal?

            * Ah, em tempo! Até demorou bastante para Patrícia Pilar assimilar o pensamento delicadíssimo de Ciro Gomes em relação ao papel dela, mas pelo sim, pelo não, recentemente a moça desertou da cama do cabra. Acho que devemos lutar pela lei Patrícia Pilar para condecorar as deselegâncias masculinas de maneiras. Assim, toda vez que surgir um cavalheiro fino para atravessar a vida de uma mulher, ela poderá ficar ao abrigo da lei, ainda antes de mandá-lo catar lata.

           

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