terça-feira, 5 de outubro de 2010

PROCESSO ELEITORAL - DOCA RAMOS MELO

Na boca das eleições, a repórter constrangedora Jadilúcia Flores entrevistou alguns personagens importantíssimos do processo eleitoral, entre aqueles que, como é usual na carreira da moça, jamais tiveram voz nos meios de comunicação. Antes de sufragar seu voto – hoje ninguém mais sufraga voto nenhum, que bobagem, é capaz de pensarem que estou falando de uma Su Fraga, até porque a era cabrística nacional dizimou o vocabulário do português usado no Brasil, menas, gente, menas -, portanto, antes de apertar a tecla e confirmar sua escolha, leia as rápidas entrevistas feitas pela profissional de A Piada Popular, o diário da cidade de São João dos Perdões.



A BOCA DE URNA

JF: Como a senhora vê a proibição da sua atividade, já que essas ocasiões eleitorais seriam as únicas em que sempre trabalhou, ou seja, como é estar desempregada?

BU: Só porque você quer! Eu continuo na ativa, apenas mudei meu modus operandi por conta desse negócio de fazer de conta, enganar trouxa, tão apreciado hoje em dia no país, mais nada. Faço um trabalho hercúleo, ou você acredita mesmo que me proíbam nos rincões desta terra, onde nem a maleita quer mais sentar praça...? Menina, você é muito inocente.

JF: Mas, nos grandes centros...

BU: Grandes centros, bah! Junte o norte, o nordeste, o fundão do centro-oeste, os grotões de norte a sul, leste a oeste, bote urna em lombo de égua, dentro de canoa de voga, no cipó, na beira do riacho, no mangue, debaixo da jaqueira, nos cafundós do Judas e você vai ver se não estou por lá, quá, quá, quá!

JF: A lei, porém...

BU: Que lei, menina? Num país onde o presidente é a opinião popular você vem me falar de lei?! Vá pentear macaco, eu estou de saída, o trampo me espera.



A DENTADURA

JF: Custo a acreditar que a senhora esteja sendo barganhada em pleno 2010, como é possível...?!

D : Querida... Você é jornalista, né? Estudou bastante, imagino. Mas, da vida, que sabe você, criança? Não só continuo valendo na barganha, como me diversifiquei, sou também milhares de cargos pelo país afora, licitações fraudulentas, consultorias de filhos, empresas de telefonia, mensaleira, aloprada, sanguessuga... Na verdade, sou hoje somente uma reles metáfora, o buraco é muito mais embaixo, mas para os pés de chinelo, continuo valendo pessoalmente mesmo. Aliás, eu, a sandália de borracha, o botijão de gás, a conta da luz...

JF: Pensei que isso estivesse sepultado no tempo dos coronéis.

D : Cada tempo com seus coronéis, querida, lé com lé, cré com cré.

JF: Isso quer dizer que...

D : Na mosca. É isso aí.



O VOTO DE CABRESTO

JF: Sei que a sua presença nas eleições diminuiu muito, mas ainda assim gostaria de...

VC: Diminuiu muito...?! Eu tenho meus redutos eternos, fiéis, renhidos, afinal, não é à toa que se dá ao povo uma escola bem esculhambada, bolsa-família, vale-qualquer coisa, vamos combinar. E hoje também acrescentei ao meu currículo pagodeiros, tiriricas, mulheres-pêras, roqueiros... Não sei se você me entende, mas eu me revitalizei, me repaginei, a cobra que não anda não engole sapo... Sou um dos pilares da democracia e, além disso, mantenho até uma escolinha na casa de Renan Calheiros.

JF: Bom, os meios de comunicação estão aí para esclarecer o povo, hoje o senhor não pode agir como antigamente, as coisas mudaram, o senhor é uma carta fora do baralho.

VC: Ai, ai, esses moços, pobres moços, acreditam em tudo, que coisa mais melancólica. Vou lhe dar um exemplozinho prático da minha atualidade eterna. Você sabe que os jornais meteram a lenha no Sarney, jogaram caca no ventilador dele, exibiram os prédios com os nomes da família dele, a montanha de grana da Roseana, as falcatruas do Fernando, o empreguismo no Senado, os atos secretos e blá, blá, blá... Agora me diga: deu algum resultado?

JF: Bem...

VC: Nem bem nem mal nem bacalhau. Vou eleger gente dele, o Maranhão é nosso. E fim de conversa.

JF: Mas isso é uma barbaridade!

VC: Ah, é? Fala isso para V. Exa. Metalurgíssima, que encabrestou mais da metade do Brasil só na conversa mole. E no que deu? Pois vou eleger também o poste dele. No mais, você me dê licença, estou ocupadíssimo.



PESQUISA ELEITORAL

JF: Muitos não botam fé na senhora.

PE: Pois deveriam. Sou parte de um sistema infalível.

JF: E como funciona esse sistema?

PE: Bem, pessoalmente, não posso falar sobre isso porque desconheço o funcionamento, afinal ainda não fui pesquisada, ninguém me perguntou em quem eu vou votar, menina, nunca me ligaram para perguntar, acredita? Aposto como você também jamais foi pesquisada.

JF: ...!



URNA ELETRÔNICA

JF: A senhora é a grande estrela do processo eleitoral, o que me diz da sua eficiência?

UE: ...Sim...?

JF: Perguntei sobre a sua eficiência.

UE: ..Ahãn...?

JF: Estou querendo saber sobre a sua eficiência, dizem que a senhora é muito segura, à prova de fraudes.

UE: Rãn..rãn...

JF: Dizem que usa tecnologia avançada que impede qualquer tramoia, funciona magnificamente, é um espetáculo.

UE: Hummmm...

JF: A senhora não vai falar nada?

UE: Acredito de que nunca antes neste país...

JF: Jesus!

DOCA publicou esta crônica em: http://www.papolivre.com.br

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